sábado, 14 de novembro de 2015

OS AGROTÓXICOS E O PODER DA PROPAGANDA

ROGELSON DA SILVA
Autor deste Artigo

No livro Música e Propaganda, do pesquisador, editor e arquiteto Paulo Cezar Alves Goulart, surge uma informação interessante sobre a origem dos agrotóxicos no Brasil. Desde a metade do século XIX tem se importado produtos com o objetivo de serem pesticidas principalmente para por fim as formigas, lembrando da famosa frase "Ou o Brasil acaba com a Saúva ou a Saúva acaba com o Brasil" de Auguste de Saint-Hilaire, naturalista francês.

A praga das saúvas era algo tão terrível no tempo do Império Brasileiro que para valorizar o valor de uma terra o seu vendedor costumava anunciar nos jornais da época "livre de saúvas".

Mas o Formicida Guanabara foi o primeiro a ser fabricado no Brasil pelo "hábil químico" Cunha Sá, conforme ele mesmo se identificava nos seus anúncios já em 1883.

Talvez o sucesso de seu produto se deva muito mais a uma brilhante estratégia de marketing do que a qual quer outra coisa. Pense bem, naquela época a grande maioria do povo brasileiro era composta por lavradores analfabetos que arrendavam as terras de grandes coronéis do açúcar, café e gado. Estes fazendeiros não moravam nas suas propriedades, mas em luxuosos sobrados nas capitais e Cunha Sá percebeu que estes eram o público alvo, não os agricultores propriamente ditos.

Na época o único meio de comunicação de massa era o jornal, e isto apenas para 30% dos brasileiros já que os outros 70% não sabiam ler. Cunha Sá publicou inúmeros anúncios nos jornais da "corte", como se chamava a capital Rio de Janeiro na época. Mesmo assim foi publicado um anuncio de pagina inteira no Almanak Gazeta de Noticias - 1884. Algo raro para qualquer produto na época.
Ele iria ousar ainda mais, em artigo de capa do Jornal "Diário de Noticias" de 6 de abril de 1888, ele lançaria um dos primeiro jingles publicitários:

Na Ilha do Governador, na Freguesia, RJ, estava instalada a Fábrica Guanabara de Sulphoreto. (...) Para divulgar seu principal produto, distribuíram, em 1888, a partitura Viva o Formicida Guanabara, polca para piano composta por Enrico Borgongino e "Offerecida aos Fazendeiros".

Segundo o escritor Paulo Cezar Alves Goulart, "Ela não tinha letra, mas em dois momentos durante a música (que era muito dançante), o pianista parava e gritava: ´Viva o Formicida Guanabara!´ e todos tinham que dar um ´vivaaaaa!´. Excelente estratégia para a época".

Mas por que uma partitura? No Brasil naquela época não existiam rádios, nem gravadoras de discos, o único jeito de divulgar uma música erá através de partituras. E ler partituras era tão comum quanto ler jornal, já que a música era uma importante disciplina escolar. O poder desta música se revela no fato que mais de 100 anos depois o grupo de choro "Os Matutos" a regravaram e postaram sua execução ao vivo no Youtube. Segue o link:
https://youtu.be/ALprvz9z73Y

Conforme o jornal Diario de Noticias de 18 de abril de 1888, o sucesso logo se traduziu em um contrato governamental para acabar com as formigas na estrada de ferro D. Pedro II. Mas este sucesso todo não passou desapercebido pela concorrência e logo surgem diversas marcas de produtos com a mesma formulação química feitos em drogarias de todo o país.

A campanha publicitária de Cunha Sá viria a inaugurar algo que vemos até hoje o uso maciço da propaganda para doutrinar os agricultores a utilizar agrotóxicos, em 130 anos isto não mudou, apenas as técnicas foram aperfeiçoadas.

Bem, quanto a composição, O Jornal do Agricultor de 1889, citou uma analise química do Formicida Guanabara e chegou a conclusão que o produto era formado principalmente por sulfureto de carbono e enxofre, tendo como impurezas o acido sulfúrico.

Além do risco de queimaduras, havia o risco de mesmo uma exposição curta, causar sérios danos residuais temporários ou permanentes. Os derivados do enxofre foram os principais pesticidas até a Primeira Guerra Mundial, quando as armas químicas serviram de base para a nova geração de pesticidas criados em laboratório.

Confira algumas imagens ilustrativas:
BIBLIOTECA NACIONAL DO RIO DE JANEIRO

BIBLIOTECA NACIONAL DO RIO DE JANEIRO

BIBLIOTECA NACIONAL DO RIO DE JANEIRO

BIBLIOTECA NACIONAL DO RIO DE JANEIRO

Um comentário:

  1. Muito interessante o artigo!
    Sempre bom conhecer a história para ter um maior embasamento para os debates...

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